1.7.20

Pós-fácio

Este é o livro que nunca ninguém há de querer ler. Mostra a intensidade e a loucura produzidas por uma existência que, por ser banal, nada acrescenta à humanidade.  Morreu, como todos, a apertar no coração a ideia universal do amor. Nada mais comum para poder ascender à categoria de corpus litetário.

Essa pessoa sou eu. Ousei escrever para além da estrada. Escrevi o mar e as estrelas em redor do meu céu.  Enchi de flores o meu riso e chorei algumas vezes ao cair da chuva. Pintei algumas telas e com traços de ilusão fui construindo os limites do meu mundo e erguendo o amor. Tantos anos tive a teimosia de querer esse entendimento único com um espelho de mim, o meu reverso que me vê e bebe a angústia da mesma fonte, o ânimo do mesmo sol, a catarse da mesma chuva, a paixão do mesmo vendaval.

Fui títere em mãos desconhecidas. Resisti, busquei, achei, não achei e de equívoco em equívoco cheguei a acreditar na imagem que me enchia , enfim, o espaço do coração.

 Fomos tudo, ou eu fazia o nada ser tudo e depois percebi que, como qualquer ser feito de palavras, eu é que não era nada.  Ou não era tudo.

Este livro, tal como a vida que o encheu de dor e prazer, nunca servirá para grande coisa, repito. Ninguém gosta de destinos quebrados. Nunca terá páginas e o cheiro dos manuais da infância. Ninguém o lerá após mim e eu também não serei mistério para ninguém.

Estou certa de que a longevidade está nos corações livres. Mas não quero viver muito mais. Desafiar o tempo é cansativo. Muito mais fácil é deslizar num sono sem regresso. E que ninguém me lamente. A  piedade, é veneno que dispenso.

Excelente epitáfio, acompanhado de um certo desenho. O manguito que o lutador vencido faz aos apupos do seu público.

Mas eu deixo um sorriso às caras anónimas que nunca me deixaram um só lírio no palco vazio.

Esta história foi a expressão maior da solidão, mas não deve ser conspurcada pela compaixão alheia. Confesso que ao escrevê-la, só por poder inventá-la, fui feliz.


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