Juntos, pareciam sombras de uma pintura romântica, enquanto caminhavam, de olhos postos no chão ou no céu, com o silêncio a esvoaçar-lhes nos cabelos
A lua era uma foice luminosa prestes a ceifar as nuvens
Os corpos retraídos, não se conheciam. Flutuavam lado a lado com medo de quebrar o encantamento
A noite caminhava para a alba, tal como eles iam em direção à vida, sem saberem bem como começar o riso, a naturalidade, a corrida, o abraço a entrega ao coberto da pálida escuridão
O homem prendeu os olhos nas estrelas e parou por um momento, quebrando o sonho com uma observação, talvez precoce, sobre a vastidão do umiverso. Sim, disse ela. Agora é real, quase lhe podemos tocar.
Conseguimos suportar tanta realidade?
Olharam-se com timidez. Não se conheciam.
Onde vamos agora que acordámos para o mundo?
A noite é bela, mas o dia pode ser insuportável com os seus bulícios e rupturas.
Não faz mal. Vemo-nos todas as noites nesta muralha. E o que faremos? Contamos as estrelas do céu.
E quando acabarmos? Contamos as estrelas que estão nos teus.
Sorriram, quebrando enfim o embaraço.
A aurora dançava já no vinco frio da paisagem. Tiveram frio, voltaram a sorrir, na tremura conjunta dos corpos. Abraçaram-se carinhosamente.
Depois, começaram a descer a colina de mãos dadas, correram, tropeçaram, ampararam-se, riram.
Já me devias há muito uma noite assim. Sim, confirmou ele. Mas também te devo um beijo, com um atraso de dezenas de anos. Foi um longo sorvo de vida. Abraçaram-se agora com paixão, sem compaixão, sem passado.
Nascemos agora.
É verdade.
O sol também nascia do outro lado.
Não tenhas medo. Somos partículas de vida que colidiram. Não importa se conseguimos chegar ao futuro, nem se venceremos juntos a estranheza do presente. Neste momento somos, eu e tu, dois corpos.
Já rompemos o luar, desatámos os arreios do pensamento.
Nascemos para o mundo real.
Sim, por um breve momento, receei que não chegássemos lá.
Onde? À ponte que tivemos de atravessar.
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