Olha, hoje faz anos que qualquer coisa aconteceu. Não sei o que foi, mas todos os dias o nosso mundo rejubila com o enamoramento do passado. No registo dos dias encontrarás o som mais agudo dos céus, a ave de rapina que rasga a solidão, o brusco tremor do véu nos lábios. Regista-te e busca na memória da casa o arrastar da cadeira, o peso da lágrima, o olhar tímido à chegada. A vibração do encontro. A esquina que me viu, a esquina que te amparou. A casa ouviu e viu, guardou. Todos os dias celebramos as migalhas do dia, os prodígios, as pequenas exaltações e só tens de olhar para os cantos dos lábios que desenharam a cidade etérea. Todos os dias acontece algo a que chamaríamos poesia se não fosse crescimento e morte do amor. Hoje é só mais um dia.
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