19.1.09

terracota









lavra uma noite de contos ao canto da chaminé
a chuva pinga apressada, com um corte de viés
as janelas aguadas como rostos tristes de mulher

tudo vive na noite lisa, sal e mistério _ vida
a pureza do silêncio a infundir medos e mágoas
como se em suspenso toda a luz pudesse emudecer
sem ser rastilho de palavras

cheguei ilesa a este lar de paz e de aconchego
plantei mais rosas, adubei mais fundo os meus desejos
e sei que aqui me acharei em mim, ainda mais cedo

sou serenamente rocha ou raiz forte que me prende
ao lugar a que pertenço e sou mais gente
contemplo a solidão à qual como um corpo me abracei
e sinto que nada há mais próximo do céu
que este momento doce e incipiente no limite do meu ser...

seráfica serpente que em meus dias cerceei
um dia quis voar com asas de assombro
e apenas junto ao amor me abandonei

posso agora pousar todas as poções
se a casa que quis junto ao amor não me advém
e nada me restitui a palavra que deixei

claustros meus de silenciosos sonhos
é como pisar os ecos do coração, com passos duros
querendo soerguer o tronco, ocupar o fruto
é na génese do mundo que me encontro

se a casa em cal se silencia, meus dedos indemnes
na soleira dos meus dias são de inverno
e eu neve e nuvem apenas me sei
na terra mansa de onde venho e... terra serei

.

1 comentário:

  1. E no meio da lama que é a internet, encontrei o canto dos lírios, onde já se transforma a lama em esculturas :)

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