27.6.20

Serra e Mar

É sábado. Acidentalmente os sábados acontecem às pessoas sós, como o chá de verbena da manhã ou o das cólicas renais mais lá para a tarde.

Acidentalmente, há uma janela e uma vista de casas e telhados alheios onde vive gente que sabe onde vai e com quem vai, mesmo que lhe falte saber porque vai.

Atrás das janelas o verbo ir conjuga-se sem qualquer complemento oblíquo, sem retas ou curvas. Vou. Era muito mais fácil não ter de acrescentar com quem. 

Acidentalmente, há sol e o mar não mora longe. Alguém disse que o mar faz companhia, não se cala um momento e é bom ficar a ouvi-lo, acenando que sim com a cabeça. 

Tenho tudo para voar, tudo para sair, tenho fugas à minha espera, cafés solos numa mesa a ver o mar, sorrisos condescendentes quando o vento me levar o chapéu e tenho uma serra para descer devagar como se fosse uma serpente a esperguiçar-se na manhã.

Tenho uma praia grande com um mar atroz que me deixa de fora, batida pelo vento. Levo uma maçã e um livro. Depois, acidentalmente, o sábado toma o sabor  de um acidulado domingo de um qualquer auspicioso advento.

Nota de rodapé:

acidentalmente ou não, o sol está preso entre mantas de nuvens, o mar é um tagarela e o chapéu já voou há muitos ventos. A solidão, essa, também está numa esplanada à espera de qualquer coisa que já não vem.  Ainda não é hoje que desço serra.

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