Com a mesa vazia, os mortos aproximam-se. São os únicos que me povoam no fim do inverno. Já nem os ossos me restam, neste quarto magro onde vivemos outrora, eu e os vivos, eu e tu, tu que viva deixaste a cal nos meus dedos, a cruz na minha pele.
Já ninguém me ouve ou me visita, ninguém reabre o livro aberto sobre a mesa, também ninguém o rasga, por absurdo, ninguém lhe beija as palavras nem as recita, como vagens, como mágoas.
Nesta casa que já foi o candelabro de um vasto amor, aqui me deixo estar, com, nos braços, o nado-vivo que embalo, o nado-morto que abalou.
Fiquei. Espero sempre a tua voz no desvão do sótão, a tua voz que me serena e suaviza e me mortifica no silêncio.
Fiquei. As pessoas que ficam não chegam nunca onde não são esperadas.
Mas esperam quem as possui, despossuídas, desamadas. Esperam o amor como as donzelas esperavam os cavaleiros tresmalhados na cruzadas.
Eu e tu, trememos ao frio das palavras. E eu amo cada fio de sílaba que te sai da alma.
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