Num sopro de luz, tu voltas, fabricante de sonhos, para me temperares um pouco a pele, um pouco a vida
Se me riscas os sentidos com a centelha que acarinhas, talvez te cruze nas palavras, outras vez desprevenida
Como se todas fossem minhas
De lírios aqui se fala. Delírios e dores, areia das almas.
Num sopro de luz, tu voltas, fabricante de sonhos, para me temperares um pouco a pele, um pouco a vida
Se me riscas os sentidos com a centelha que acarinhas, talvez te cruze nas palavras, outras vez desprevenida
Como se todas fossem minhas
Comecei a desaparecer suavemente, com a mesma anónima entrada que fiz no mundo
Vi com estes olhos a ruína do mundo, o mover de lodos e areias e fechei a porta a todos
Fui com sinceridade falsa e falsa fui comigo, ao mentir o que digo e mesmo o que não digo
Esperei demais por quem não vinha e quem veio não me encontrou
Foi pena. Há vidas que se perdem num horizonte de saída
Para a longínqua névoa nunca cumprida
Escuta
Esta noite é mais aguda.
Alguns cães ainda ladram à passagem da nossa sombra.
Eu estou sentada no eixo duma escuridão sem nome. Tu recitas versos de luz e eu acendo os olhos cansados.
A noite é aguda, como sabes. Há ângulos que desconhecemos.
Por exemplo, esta pode ser uma noite de cometas e prodígios, estrelas cadentes risonhas com um laço azul na Lua.
Ou pode ser apenas um ângulo equilátero em que todos os lados estão previsivelmente certos e tu estás longe e eu estou perto ou o inverso, mas estamos os dois igualmente distantes.
E sós.
Deixo-te um nó na garganta para desatares, se quiseres, deixo-te pontas para atares a tua vida à vida, o ângulo mais congruente da existência humana.
Deixo-te o fino sopro da minha voz.
Quando ganhamos idade, aí umas seis dezenas de anos, temos a mão cheia de sentimentos doces e pacatos
Como a fruta fora de tempo, o sumo é feito da luz que nos crestou
Já não vivemos o amor, aquele que nos dilacera o coração, mas começamos a pensar que amar é exatamente chegar longe e viver perto um do outro
Todo o amor esvoaça, primeiro tenta, descobre-se e depois voa
Ai daquele que nunca caiu do alto de um amor, para voltar a esvoaçar na mesma direção
Os amores-perfeitos são aqueles que, mesmo sem tempo, se deixam verter no tempo
Porque é sabido que amar no mundo é perder as asas de amar
E o mundo não sabe nada. Os que guardam o tempo - os amantes sem tempo, sim
Pois foste, foste sempre assim:
Frágil, frugral e feiticeira
Sempre nos outros o que (só) achas em ti
O que só se abre em ti
Deste alento e energia, deste a alma, deste o corpo
Deste o teu sangue e sangraste até ao fim
Passou o tempo e voltou a passar
E tu deste, deste, continuas a dar essa pálida energia (que agora reténs)
Esvaziaste o peito, palavra a palavra, até o silêncio apenas te servir
Agora queres apenas salvar, reter alguma coisa, poupar a febre, o fogo, a fala
Algo teu que encha o silêncio, a frugalidade ímpar de estares simples e só, sem chegar nem partir
Porque a peregrinação começou fora e acabou dentro e a solidão é um pátio limpo com magnólias a florir
Dá-me duas palavras, apenas duas. Com elas rasgo as pedras do nosso altar adormecido
Dá-me outro sentido à viagem por amor, em marcha à proa, passaporte anímico no bolso da imaginação
Duas palavras servem para me dares jubilosa voz
E, assim, só te peço que sejas matéria viva dos meus sonhos - podes vir - reconhecerei o anil da tua luz
mas se me mostrares de novo a beleza do mundo, eu poderei, talvez, voar
uma palavra tua e farei das estrelas o lugar
em barro modelo o teu corpo, nasço de novo a tua carne
tu que me intercedes, tu que me devolves, tu que conténs o tempo e a pele
se quiseres, afogo o coração e solto a tua alma no mar, onde seremos, por fim, lágrima e sal
as coisas mais improváveis acontecem em todo o lado, mas raramente a mim
porém, hoje percebi que estou presa e livre num universo sem ti
a mais improvável razão de viver é esta coisa paradoxal de querer e não querer mendigar o que julgamos ter
poderia dar-se o caso provável e imperioso de me deixares partir
pois que me habita esta ideia improvável de amar o universo mais abstrato e distante de ti
Há muita chama que não se vê, por exemplo, o rubor da Lua e o fundo dos teus olhos quando se acendem para mim
Perigosamente perto, queimo óleos e ilusões, deixo arder, deixa ver, deixa ver
Em quantas noites nuas se escreve o amor e
Em quantas luas se reflete o azul do mar e
Em quanto mar se mira a lua nestas noites de sonhar?
Em quantas mais palavras direi ainda a paixão de viver?
Com quantas rimas e espinhos te espalharei mais rosas pelo caminho?
A urgência lenta de dizer desta agonia do tempo
E na tua ausência perto, quanto mais brilhará na sombra, a lua azul de sempre?
Quando achares a beleza, pára o teu coração e não faças mais nada. Deixa-te morrer por momentos enquanto a olhas, enquanto a ouves, a bebes ou a tocas.
Eu confesso que sou caçadora de momentos. É como sentir no peito uma caixinha de música ou como sair de si para ser parte da beleza.
E, sabes, daria o meu olho miope para encontrar a beleza que só tu reúnes, em todos os sentidos.
Meu amor, tu nos meus sentidos... seria a maior beleza pelo universo consentida.
Dois dedos de conversa, ele casualmente passa, como os namorados de antes, olha e confirma
Ela pura e casta, roliça e franca não se recusa
Ele gajeiro e forte com fogo nos olhos mira nos seios o corpo de enfusa
Na lua um ramalhete seco e algum silêncio de malha, bordados ainda a pairar nos dedos
Entre duas gargalhadas, carícias que tolhem o corpo, trepadeiras finas os dedos que passam
E como os seus olhos chamam a chama da tarde
E como ela se faz inocente, mas prega a fundo os olhos nele
Lembras, numa outra existência?
O namoro à antiga, eu e tu, à sombra das tílias, um leve roçar do braço, a saia a esvoaçar na tarde que finda
E a fina filigrama de uma carícia que arrepia
Por fim, um saboroso beijo que sela a promessa e termina o dia
Se fosse o peso era pesado, se fosse a pressa era só prazo, se fosse leve era leveza, se fosse fundo era pausado
Se fosse oculto era pulsão, se conversado era sentido, se combinado era sonhado, se adiado era pena, se recusado era pecado
Alcançar a árvore mais alta, com o mais alto voo de águia
Ficar nela sem jamais descer aos baixios podres da terra
Guardar nas penas outras penas que um dia serão leves
Como o cair da ave sobre a neve e o seu eterno sono breve
"Põe-me na Líbia ardente ou na Cíntia fria" ¹
Onde nenhuma criatura humana perturbe a paz de te guardar na minha vida
Onde uma onda fresca me invada de ti imerecida
¹ Camões, Lusíadas
Era uma igreja fresca como só os lugares de pedras milenares são
Frescas, mudas e com tempo, as pedras partem do chão
Continuam nos arcos de volta inteira, nas abóbodas completas, atentas como orelhas
E ouviram-me por certo chorar por dentro e pedir silêncio a todas as seráficas figuras de santos, anjos e curandeiras
O meu mal de amor não tem lugar nem fronteiras
Nasceu-me cedo e ficará a vida inteira
Árvores caladas conjugais, clorófilas por natureza, contidas no osso forte do seu tronco
Só vejo isso e não vejo pouco
Como elas, gostava de saber que é assim que somos
Uma intemporal massa verde nascida do lodo
Estendo a minha mão levemente enluvada
Para que tires o botão e beijes (demoradamente) as veias enlutadas deste punho
Louco por ti, forte para ti
Is it important for you that flowers flourish
in random, so that
sun spreads fire in your silk skin
So softly that the wind
make tender curls in your hair
So tenderly
That some lost woman open her heart to the deep earth and
Pull out gold, sand, love, living imagery?
I regret to say that used to be me,
now buried in sadness in the most dry sand mill
Will you take some pain over my hair, I just have this waven hand to report alive
To the other lost people finding his path to surface where we can flee high
Ouvir e sentir em loop.
https://youtube.com/watch?v=0wULm54X5Ao&feature=sharedO retrato está na parede (vazia), demasiado perfeito para ser verdade
Os retratos já são a morte a olhar-nos, a morte do rosto, a morte do momento
E depois, antes da luz havia a câmara escura e o mistério do rosto
Amamos por dentro sem a luz dos olhos, buscamos um rosto na câmara escura
Perdemo-nos quando nos encontramos, nus, cegos, dentro de uma redoma barata
Fomos atravessados por dentro num violento golpe do olhar alheio
E, assim, profanados e inseguros, ansiamos e receamos que a imagem exposta seja um perfeito daguerrótipo
Estou a estudar a linguagem única do amor.
Um código exclusivo que nasce nos olhos, passa pela boca e termina nos lábios. Um laço de palavras e uma flor.
Poesia, vinho, riso e a música das mãos. Deve ser esta a linguagem do amor.
A ti ainda não te disse algumas coisas. Por exemplo, sabias que sonhei contigo há duas noites?
Vinhas com a voz contida num discreto diapasão e eu com uma harpa tonta na garganta
Foi tudo tão casual como os encontros dos bichos da terra
Um toque de antenas e um choque de pôr o coração à porta do hospital
Por favor, tenho de pedir-te que não voltes aos meus sonhos sem ser para ficares a noite inteira
So, you should never wait for love, baby. You live in Chinatown and I'm not there anymore. Forget it. There is no love in Chinatown, Jake.
Em memória de um grande argumentista hoje desaparecido, Robert Towne.
Desfolhas o livro pela mão de Cristo ou Satanás e feres a vista na laboriosa letra da esperança
Mas a fé profana o texto, com os caminhos avessos que tiveste de folhear
E a páginas tantas o livro muda e mudo fica o seu dizer
E peregrinas de novo pelo livro que terás contigo à cabeceira e lerás até ao fim
Repara, é a morte crescente, o peso dos minutos que queres preencher
Podes iludir a existência
Mas é ela que te ilude a ti
O tempo é liso e demorado e existem tantas fugas, tantas mentiras, até ao fundo do que vês
Mas a pulsão é inversa ao que esperas viver, esperando por aquilo que virá, talvez
Estou comigo e é comigo que estou. Falo-me e não digo nada. Canso-me de mim todos os dias. Exausto-me à noite.
Esta ciência da solidão pesa mais do que parece. Mede-se numa proveta de silêncios. Podemos até ficar admirados por existirmos.
Se me ouves, talvez me entendas. Se me entendes, bem podias rasgar a noite imensa subindo ao cume da voz, ao cicio do segredo.
Confirma. Eu existo porque tu existes? Eu existo mesmo que não existas?
Preciso de ti, percebes? Como a árvore espera o vento para poder alisar os ramos.
Estendendo a outra árvore os seus beijos.
A espuma de uma onda a desfazer-se em bolhas, a minerar a areia
Bolhas de ar como minutos que rebentam um a um
Enquanto o relógio atarda tudo e o mundo é mudo
Olha as pedras, como são sábias.
Algumas macias, outras argutas. Pedras dementes, proeminentes.
Fazem um passeio tosco ou elegante as pedras.
Fazem caminhos áridos onde só anda quem nada sente.
Pedras de arremesso, quem as esconde?
A mineralogia não é a minha ciência, mas gostava de alisar as pedras que ferem os pés do caminhante.
As pedras macias e quentes são as que procuro, no mar e na terra.
Pedras macias na minha pele, um toque doce quase afago
Essas são as pedras que eu trago
Já fui,
Tudo já foi
Mesmo o que ficou é ido
Não me busques aqui nem em qualquer lugar
Quem quer que encontres já não sou eu
Porque já fui
O que quis ser passou
Estarei em qualquer afago da brisa, na cortina que se agita, no bater síncrono dos corações resistentes
Cearas, montes e rios são doravante os meus limites
Mas fecha a porta.
Que ninguém mais se lembre que existes
Não te esforces mais pelo velho ramo da árvore podre
Se o vento a leva para longe, se ela te foge, deixa
Não alcances quem se afoga no seu próprio elemento
Tu és a árvore frondosa da manhã e a tua sombra é fresca
Não queiras o rio estreito, com margens calcinadas
Busca antes o amplo dorso da terra alta iluminada
não há flores a florir no meu corpo, nem ouro falso
meus dedos foram pianos mudos, meus seios serenos mudam
e os braços remos que rasam a terra, escavando, podando o mundo
trago amor no regaço, aceso e puro como um regato
em tudo o mais tenha a idade das estrelas e a precisão dos astros
mas o amor... não o acho
Os meus dedos seda e linha cosem os teus olhos com doçura. Baixas, as pálpebras sentem os fechados sons na noite
Trazem um indeterminado risco de luz muito silente
Em que certas palavras e gestos são uma cisão (quase) demente, no cenário de noites idas, as que nos trespassa(v)m os seios os membros, os ombros e os sentidos
E eu coso com os meus dedos o mundo possível, os medos, a fome, a alma bruta dos esquecidos
Mas coso o nosso mundo como se arma a casa de um botão, que entra e sai no peito destemido
Abro uma janela para ti, na rua projetada ao bairro escuro, onde a sarjeta regorgita as nódoas do último verão
As folhas de um outono lodacento
esmagadas pelos passos (cegos) de quem vai e volta, vai e volta, sempre na mesma direção
Sabe a sal a chuva urbana para os que vêm e vão
Eu, sentada numa repartição, à espera, à espera, e és tu que chamo, em fuga, em fuga, para onde os sonhos vão
A vida, a vida, sabes, desarma o sonho, não te inclui sempre, nem sequer me inclui a mim
Como na repartição, esperamos a nossa vez e, na espera, contemplamos o tempo, essa página
Que abre o meu peito para ti, onde cabes, onde sempre coubeste, onde a espera, de tanta, até se esquece
A vida, sabes, tem muitas repartições. Mas nenhuma parte claramente aberta
Que nos entre para sempre o ser sonhado, 'para sempre' sendo a parte mais incerta
Vamos e voltamos, e se abrimos o sonho é porque temos uma asa aberta e um caminho que (ainda) nos espera
Sabes? Às vezes, quando fecho a luz de todas as fontes, fica um fio de água acesa, com o seu tímido rumor de gente.
Será fuga será dor? Água não é certamente, é o amor que sopra assim.
Às vezes, a natureza morta vive destas fontes que só o ser vê que só o outro sente.
Conto pelos dias os nós dos dedos
Tempos passados nos levaram cedo e fomos
A metade lunar, a meta da luz, o mel mágico e a mágica flor
Nos altos lumes onde nos arde o mesmo amor
Os meus olhos gelaram na terra fria, ventou demais onde estivemos, secaram-me os olhos, meu amor, palavras brasas antes agora cinzas.
Que posso fazer por ti, minha alma, que não fizera já? Rosas e rosários desfolhados em teu louvor, roubados arroubos de uma vida cega, onde ainda sangue que cresça erva?
Ando pela vida com ligeireza, com a mesma desatenção com que largo os sapatos do dia, à entrada dos meus pés e again,
Na casa, em casa, numa casa qualquer, entro e depois não sei sair. Dispo-me devagar no soalho, deito a minha pele como cera, e aliso o brilho dos olhos nesse temporal e, olha,
Não me digam, pessoas, olha ali estão elas, again! não as conheço com os seus laços e lenços sem luz, nem enamoradas afeições e até
Na rua, fecho-me em parêntesis retos como vidros à prova do olhar, para não me captarem a dor dos passeios enlameados e sei
Se entranço o sonho e me ponho a dançar, receio gostar tanto (de ti) again que, depois, não possa parar
Ah, as enamoradas afeições que nos faziam tremer em cada carta! Sou a sombra exata do fim do amor, letras apagadas, destroçadas, sem sabor
Suavidade. Sinto o conforto, a lisura das emoções, o precalço de tropeçar nos teus olhos, num abraço longo de silenciosa paixão. Suavidade. Como ficamos depois de calçarmos devagar o amor.
A suavidade que me dás envolve todo o meu ser.
Se a vida nos venceu, que nos não vença o amor.
Prometo amar-te à margem do tempo, se tempo tiver para tanto.
Num sopro de luz, tu voltas, fabricante de sonhos, para me temperares um pouco a pele, um pouco a vida Se me riscas os sentidos com a centel...